"Quem são as Górgonas?
São seres cuja natureza comporta traços absolutamente contraditórios.
Sua monstruosidade consiste em apresentar traços incompatíveis entre si: são parcialmente imortais – duas delas – e parcialmente mortais – a terceira; são mulheres, mas em suas cabeças crescem serpentes horrorosas, que lança, olhares selvagens; levam nos ombros imensas asas de ouro e podem voar como pássaros; suas mãos são de bronze.
Conhecemos um pouco melhor a cabeça, extraordinária, ao mesmo tempo feminina e masculina, pavorosa, embora alguns se refiram à bela Medusa ou às belas Górgonas.
Nas imagens que as representam, vemos que têm barba.
Mas esses rostos barbudos não são completamente humanos, pois têm uma dentadura animalesca, com duas presas compridas de javali aparecendo em suas bocas abertas num ricto, e de língua de fora.
Dessa boca torta sai uma espécie de grito terrível, como o de um bronze no qual batemos e que nos paralisa de terror.
Há, sobretudo, os olhos.
Quem as mira nos olhos é imediatamente transformado em pedra.
Tudo o que caracteriza a coisa viva – a mobilidade, a flexibilidade, o calor, a suavidade do corpo -, tudo se torna pedra.
Não é apenas a morte que enfrentamos, é a metamorfose que nos faz passar do reino humano ao reino mineral e, portanto, ao que há de mais contrário à natureza humana."
Trecho extraído do livro "O universo, os deuses, os homens."
Jean-Pierre Wernant
Companhia das Letras, 2000, p.187-188.
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